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quinta-feira, 13 de março de 2008

Forma X conteúdo

Muita gente justifica a qualidade de um produto com a quantidade de vendas do mesmo. Assim, o jornalista Reinaldo Azevedo atesta a excelência de Veja com base na tiragem de 1200000 exemplares da revista. Bela tiragem, diga-se de passagem, que não reflete o número de pessoas que lêem a revista, pois um exemplar pode ser lido por várias pessoas. A Veja é lida por um público muito amplo e diversificado. Mas, no meio de tanta gente, quantas pessoas têm, realmente, capacidade crítica de leitura? Qualquer pessoa, por mais desinformada que seja, consegue perceber o tipo de jornalismo praticado por Veja. Rasteiro, mal intencionado, sujo. Chegamos a uma questão importante: o que vende mais, a forma ou o conteúdo? A julgar pelos casos que vemos por aí, pelo sucesso de determinados formatos, como o BBB, os Rebeldes, parte do cinema hollywoodiano, dentre outros, o que vende mesmo é a forma, a casca, o verniz; o interior pode vir recheado com qualquer coisa, pois se a embalagem for bonita, o produto vende. Assim é com a revista Veja e com parte da nossa mídia. Forma bonita, conteúdo tosco, e tome venda e sucesso. E o pior, com justificativa intelectual! Mas enfim, vamos lá. Tudo isso é para indicar as leituras abaixo:

http://luis.nassif.googlepages.com/home

Minha recomendação é que acompanhem essa discussão no Observatório da Imprensa também. Se tiverem estômago, visitem o blog do Reinaldo Azevedo.

Essa semana aconteceu uma coisa engraçada: as revistas levaram um tombo com essa disputa Equador x Colômbia, Chaves/Correa x Uribe. Sairam reportagens (na Carta Capital pró- Equador/Venezuela; na Veja pró-Colômbia) falando sobre o perigo da guerra, quando a situação já tinha sida resolvida e os presidentes já tinham apertado as mãos na OEA. E vi uma matéria na Veja agora que demonstra que jornalismo opinativo/dedutivo deveria ser feito com muito cuidado:

Fim da lua-de-mel para campanha Obama: Obama, o astro pop da corrida eleitoral americana, perde três disputas para sua concorrente Hillary Clinton, vira alvo de ataques e começa a cair na real.

Obama ganhou mais uma ontem e parece não estar tão mal assim!
Ps: Este post foi escrito em 2008, antes das eleições americanas. Obama é hoje o presidente dos Estados Unidos.

Hipoteticamente falando

Luís Fernando Veríssimo imagina-se em uma ilha deserta com seu livro, seu CD e sua mulher preferidos. Ele é, entretanto, vítima de um engano. Um gênio o para na rua e o pergunta que livro, que CD e que mulher ele levaria para uma ilha deserta. Imaginando que fosse uma pesquisa de opinião, e sem desconfiar do turbante, ele responde, e é mandado para a tal ilha com seus ‘pedidos’. Ao longo da história ele tenta conquistar a mulher, que obviamente não queria estar na ilha. E não consegue se aproximar dela. Também não consegue ouvir o CD, já que não tem aparelho de som e muito menos eletricidade na ilha; nem acha graça em reler infinitas vezes o mesmo livro. O tempo passa e o CD é usado como lente para fazer fogo, as folhas do livro são usadas como combustível na fogueira e o fecho do sutiã da mulher é usado para fazer um anzol, com o qual eles pegam pequenos peixes. A mulher, por ser mais jovem, sobe nos coqueiros para conseguir comida e constrói a cabana rudimentar na qual eles vivem. Com o passar dos anos ela se interessa por ele, mas enfraquecido pela idade e pela má alimentação, já não tem mais forças e a rejeita. Em tempo: o livro é "O Grande Gastby" de F. Scott Fitzgerald, o disco é do Miles Davis com o Sonny Rollins e o Horace Silver, e a mulher é a Luana Piovani.
Fico imaginando se fosse comigo. Não sei se teria como responder assim de surpresa que CD, que livro e que mulher eu levaria para uma ilha deserta. Ficaria com dúvidas em relação ao CD e ao livro. Quanto à mulher não. Iria perguntar se podia levar mais de um CD, mais de um livro. Porque são tantos que me agradam igualmente que não posso escolher apenas um deles. Ia querer levar uma biblioteca inteira. Ou uma enorme coleção de CDs e até alguns vinis raros.
Quando o gênio me perguntasse que livro, que CD e que mulher eu levaria para a ilha deserta, eu perguntaria se não poderia levar todos os discos dos Beatles, todos os do Radiohead (pelo menos o The bends e o OK Computer), os discos do The Smiths, Los Hermanos e mais um punhado de CDs. E livros então? A maior parte dos clássicos da literatura eu ainda não li. Estou esperando a velhice chegar. E sempre dá vontade de reler aqueles livros que marcaram nossa vida. Cem anos de solidão do Gabriel Garcia Marquez e Crime e castigo do Dostoievski eu levaria com certeza.
Imagino o gênio me perguntando:
– Cavalheiro, que disco, que livro e que mulher você levaria para uma ilha deserta? – os gênios são muito educados
Eu responderia:
– Tenho que escolher um só de cada. Posso levar a discografia do Radiohead e dos Beatles? A bibliografia do Machado de Assis, toda a Comédia Humana do Balzac, os livros do Gabo (que intimidade) e os dos Veríssimos (pai e filho)? E a Luana Piovani, a Maria Fernanda Cândido, a Ana Paula Arósio, a Julia Roberts, a Gisele Bundchen...?
– Não, tem que ser um livro, um CD e uma mulher! – responderia o gênio, com certeza rindo da minha cara e pensando: quem ele pensa que é?
– Mas como eu vou viver sem Beatles, The Smiths, Los Hermanos? E sem ler os clássicos da literatura. Que eu estou deixando para ler na velhice. Além disso, como não vou ter TV, vou levar algumas atrizes e modelos só para me distrair e não me sentir sozinho – eu argumentaria, mas nada disso iria convence-lo.
Pensando bem não ia dar certo. Melhor mesmo seria ele me mandar para a ilha com um Notebook, um Ipod ou um Palmtop. Neles caberiam toda a minha biblioteca, minha Cdteca e de quebra ainda sobraria espaço para uns joguinhos e para as fotos das minhas musas. Eu diria ao gênio que me perguntasse que livro, que CD e que mulher eu levaria para uma ilha deserta: quero levar um notebook, uma fonte de energia inesgotável para o aparelho e uma mulher apenas. Nada mais. Ele não ia ter como recusar.

VERÍSSIMO, Luis Fernando. Cuidado com o que você pede. Disponível em: http://www.gsdr.dc.ufscar.br/~wesley/verissimo_cuidado.html.
Ronaldo Silva - 28/02/2007

Dos dias de chuva, tristeza e solidão!

"Vivemos numa época complicada". A frase de uma dançarina espanhola, dita ao meu amigo Júlio, soa como um sentimento global. Em todos os países, em todos os lugares as pessoas devem estar pensando, falando e sentindo: vivemos em uma época complicada. Complicada pelas toneladas de coisas que sabemos, ficamos sabendo e muitas vezes não gostaríamos de saber sobre guerras, violência, fome, preconceito e exclusão. Vivemos numa época complicada porque sabemos demais. A cada ato de desumanidade que assistimos, a cada agressão que nos chega pela TV, jornal e, principalmente, Internet nos assustamos com nossa bestialidade. Mas não foi assim desde os primórdios do homem, com seus sacrifícios aos deuses, com os "inimigos" atirados aos leões, com a fogueira da inquisição, com a matança no novo mundo e outras atrocidades que fazem parte da história evolutiva da humanidade? Por que nos assustar com a violência, se ela está em nosso DNA? Por que nos sentir revoltados com as desigualdades sociais e com as privações de bilhões, se o que queremos é nossa glória individual? Se nosso maior desejo é o consumo desenfreado, sem limites e sem nos importar com os outros? Estes paradoxos são tão inexplicáveis quanto nosso sentimento de solidariedade diante da tragédia. De repente somos tomados de profunda comoção com o sofrimento do outro. Mas ainda assim fazemos isso por puro egoísmo. Sofremos pelo outro porque nos imaginamos no lugar dele, passando pelo mesmo sofrimento.
Nestes dias, quando vimos nosso alma arrastada presa a um carro por sete quilômetros, passamos a bradar por justiça com mais força e vigor. Queremos a cabeça dos monstros capazes de tamanha crueldade. Dos pensadores mais ilustres da nação ao mais simples dos homens, todos clamam por justiça, uma justiça bíblica até: olho por olho, dente por dente. Devemos prender os monstros em um carro e arrastá-los pelos mesmos sete quilômetros de terror, que tanta vergonha e indignação nos causaram.
Nossa individualidade, ganância e egoísmo nos impedem de ver o quanto somos responsáveis pelas monstruosidades que são cometidas todos dias contra crianças, jovens, adultos e velhos. Da fome à supressão dos direitos mais básicos, muitos são os ataques covardes à condição humana. E quando os monstros resolvem sair à caça, nós os financiamos e facilitamos sua ação. Pequenos atos, que parecem banais, podem gerar ondas gigantes de destruição e crueldade. É infinita a lista de atos dos homens de bem que ajudam a criar monstros capazes de arrastar nossa alma por aí. A manutenção de nossos vícios, a vontade de levar vantagem em tudo, nos fazem caminhar à margem da lei e criar os monstros que tanto nos aterrorizam. E depois só nos resta buscar culpados e clamar por justiça, justiça bíblica, lei de talião. Vivemos numa época complicada!

Ronaldo Silva (depois de ler "Do amor e outros demônios" e ouvir o clamor que brota do seio da terra por justiça e punição para os monstros do Cascadura.)